Hoje
trago um assunto que ainda é pouco conhecido, mas que deve ser colocado a
conhecimento de todos, devido a sua importância na vida de muitas crianças e adolescentes
brasileiros. A Lei n. 8.069/90 que instituiu o Estatuto da Criança e do
Adolescente – preconiza em seu artigo 19, o direito das crianças à convivência
familiar e comunitária. Contudo, quando estes direitos se encontram ameaçados
ou violados por ação ou omissão da sociedade, do Estado, dos pais ou
responsáveis, ou em razão de sua própria conduta, o ECA apresenta como medida
de proteção a colocação das crianças e adolescentes em famílias substitutas ou
abrigo em instituições, considerando prioritárias as medidas que mantenham os
vínculos familiares e comunitários.
Sabemos
que a família é fundamental para garantir a proteção integral à criança e ao
adolescente, no entanto, existem situações em que o afastamento da criança do
ambiente familiar é necessário para que a proteção continue garantida. Assim, a
colocação de crianças e adolescentes em abrigos (antigamente conhecidos como
orfanatos) deve ser provisória e excepcional, praticada somente quando os
direitos da criança e do adolescente se apresentam ameaçados ou violados em
casos de grave risco à sua integridade física e/ou psíquica, tais como
abandono, negligência, dentre outros fatores que podem influenciar o
desenvolvimento biopsicossocial de crianças e adolescentes.
O
ambiente familiar dos abrigados é em sua maioria, marcado por adversidades de cunho
econômico, social e psicológico, dificultando o cumprimento dos deveres dos
pais. Assim, famílias em situação de vulnerabilidade social, na maioria das
vezes, não possuem condições mínimas para garantir o bem estar dos seus membros.
Algumas características podem estar presentes no cotidiano das famílias pobres,
tais como o desemprego, desnutrição, nascimentos pré-conjugais, instabilidade,
violência familiar, distúrbios mentais, delinquência, abuso de substâncias,
morte precoce, estresse contínuo de habitações inadequadas e constantes dívidas
(Hines, 1995). Apesar destas características pertencerem ao cotidiano das
famílias pobres, o Art. 23 do ECA dispõe que a falta ou a
carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou
suspensão do poder familiar.
Contudo,
conforme pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada – IPEA (Silva, 2004), cerca de vinte mil crianças
encontram-se abrigadas no Brasil em regime de permanência continuada, fazendo
da instituição seu local de moradia e a pobreza
é colocada como um dos principais motivos do abrigamento, seguido pelo
abandono, violência doméstica, dependência química dos pais e responsáveis,
vivência nas ruas e orfandade (Vectore, 2007). O abrigo é um importante
microssistema para o desenvolvimento humano, podendo representar um fator de
risco ou proteção na vida dos abrigados. O atendimento padronizado, o alto
índice de criança por cuidador, a falta de atividades planejadas e a
fragilidade das redes de apoio social e afetivo são alguns dos aspectos
relacionados aos prejuízos que a vivência no abrigo pode exercer no indivíduo
(Carvalho, 2002).
Por
outro lado, estudos afirmam que as instituições de abrigamento podem oferecer
boas oportunidades, e ressaltam que, em casos de situações ainda mais adversas
na família, a instituição pode ser a melhor saída (Dell’Aglio, 2000). Desse
modo, o cotidiano do abrigo (rotina, atividades desenvolvidas) possui
importante influência sobre o desenvolvimento psicossocial de crianças e
adolescentes. Sendo assim, a depender das características físicas e
psicossociais, o abrigo pode ser um fator de risco ou proteção ao desenvolvimento
dos abrigados. O abrigo precisa oferecer um ambiente que melhor
represente a convivência familiar. Uma estrutura física semelhante ao de uma
residência, com adultos responsáveis pelos abrigados e o contato destes com
pessoas da escola e da comunidade, oferece uma gama de novas interações,
possibilitando a formação de outros vínculos sociais, que são saudáveis ao
desenvolvimento dos abrigados.
Com informações extraídas de: Carvalho,A.M.(2002).Crianças
institucionalizadas e desenvolvimento: possibilidades e desafios.SP:Casa do
Psicólogo.;Dell’Aglio,D.D.(2000).O processo de coping,
institucionalização e eventos de vida em crianças e adolescentes.Tese de Doutorado não-publicada, UFRGS.Porto Alegre,RS.;Hines,P.M.(1995).O
ciclo de vida familiar nas famílias negras pobres.Porto Alegre: Artes Médicas.;Lei n. 8069, de 13 de julho
de 1990.Estatuto da Criança e do Adolescente.
Brasília.Senado Federal:Centro Gráfico;Silva,E.R.A.(2004).O direito à
convivência familiar e comunitária: os abrigos para crianças e adolescentes no
Brasil.Brasília:IPEA/CONANDA.;Vectore,C.
(2007).Estratégias mediacionais:possibilidades de inserção do psicólogo
escolar/educacional em abrigos. Campinas,SP.Alinea.
Paula Bezerra – Psicóloga CRP-03/9980
Paula
é natural de Sr. do Bonfim. Bacharel em Psicologia pela UNIVASF. Pós-graduando
em Psicologia do Trânsito. Atua na área da Assistência Social (CRAS). Contato:
paula.psique@hotmail.com
Ótimo artigo. Bem esclarecedor!
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